Em primeiro lugar, a FEE produz algo que é essencial para qualquer governo: informações e pesquisa empírica. Em segundo lugar, esse serviço não pode ser adquirido em mercado.

Marcelo Portugal

Economista e professor da UFRGS, UFRGS

Faz muitos anos que a situação fiscal do Rio Grande do Sul é preocupante. O enfrentamento do nosso problema fiscal foi sendo adiado recorrentemente. O último dos paliativos foi o endividamento junto aos depósitos judiciais. Mas até mesmo essa fonte parece ter secado. O Governador Sartori se vê frente a uma realidade que não pode mais ser evitada. Tenho de parabenizá-lo por estar mostrando de forma transparente para sociedade gaúcha o tamanho do rombo fiscal e explicitando que, para superá-lo, precisaremos de muitos sacrifícios.

Recentemente foi apresentado à sociedade gaúcha um novo plano de ajuste fiscal que, entre outras coisas, busca redimensionar o tamanho do Estado. Há, nesse aspecto, uma proposta de extinção de várias fundações. Segundo o próprio Governo, a escolha das fundações a serem extintas foi feita segundo a avaliação de certos aspectos, tais como: manter o foco do Estado nas suas atividades essenciais; a disponibilidade dos serviços prestados por essas fundações em mercado; a avaliação das estruturas administrativas existentes atualmente; e o custo das mesmas para o Tesouro. Novamente, aqui, me encontro em acordo com o plano de ajuste fiscal. Se uma determinada fundação não produz um serviço essencial, tem uma estrutura inchada, produz algo (um bem ou serviço) que pode ser adquirido em mercado e custa muito ao Tesouro do Estado, não resta dúvida de que tal fundação deveria ser extinta.

Gostaria de argumentar, contudo, que a Fundação de Economia e Estatística (FEE), que está na lista das extinções, não se encaixa no perfil descrito acima. Em primeiro lugar, a FEE produz algo que é essencial para qualquer governo: informações e pesquisa empírica. Em segundo lugar, esse serviço não pode ser adquirido em mercado. Na verdade, não é por outra razão que diferentes governos têm ao seu dispor algum tipo de organização que produz e analisa dados. No caso do Governo Federal, temos o IBGE. No caso do Governo norte-americano, temos o Bureau of Labor Statistics (BLS) e o Bureau of Economic Analysis (BEA). No caso dos Estados de São Paulo, Minas Gerais e Paraná, temos, respectivamente, a Fundação Seade, a Fundação João Pinheiro e o IPARDES. Repito: a produção e a análise dos dados de renda, emprego, preços, condições socioeconômicas e etc. são elementos fundamentais para a elaboração e a avaliação de políticas públicas, constituindo-se em uma atividade essencial de governo, que não pode ser comprada no mercado de bens e serviços privados. Isso é fato no RS, nos outros estados, no Brasil e nos demais países do mundo.

Em terceiro lugar, há que se avaliar os dois últimos aspectos, a saber, o tamanho da estrutura existente atualmente e o custo da FEE para o Tesouro. Esse dois itens correspondem, na verdade, a um só, ou seja: o custo da FEE para a sociedade gaúcha, tanto no que diz respeito diretamente aos repasses do Tesouro quanto à possibilidade de realocação das suas estruturas atuais. A esse respeito cabe destacar que a FEE compromete uma pequena parcela do total das despesas do Governo do RS. A Fundação, em 2016, custará ao RS cerca de R$ 32 milhões, o que significa 0,06% do orçamento do Estado e uma redução de 50% em termos reais desde 2011. Destes, R$ 14 milhões permanecerão mesmo com a extinção da FEE, uma vez que eles representam o custo com servidores estatutários. Some-se a isso o fato de que metade desses servidores estão inativos e a outra metade pode se aposentar a qualquer momento. Mesmo que as tarefas sejam realocadas, o que por si só geraria um elevado custo, os processo de produção de indicadores e análises, bem como a tecnologia, seriam perdidos com a sua extinção,

Há um ditado inglês que diz Don’t throw the baby out with the bathwater. Ou seja, não jogue a criança fora junto com a água do banho. Ou, em outras palavras, no processo de tentar se livrar de algo ruim ou inútil, a água do banho, temos de tomar cuidado para não nos livrarmos também daquilo que é essencial, a criança. O Governo do Rio Grande do Sul está tentando redimensionar o tamanho do Estado para jogar fora o descontrole fiscal. Muito meritório. Mas tem de, nesse processo, cuidar para não jogar fora também a criança.

A FEE, assim como qualquer outra organização privada e, principalmente, pública pode ser tornada mais enxuta e eficiente. Certamente há desperdícios e atividades de baixa produtividade que podem ser eliminadas e/ou redimensionadas. Mas extinguir a FEE seria deixar o RS sem informações e pesquisas importantes para o planejamento e a avaliação de políticas públicas. Isso forçará esse e os próximos governos a “planejar no escuro”.

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